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Vindima sob o espectro da crise
Produtores vendem 'stocks' a preço de saldo para arranjar espaço nas adegas para o novo vinho, alerta a Anceve

As vindimas estão à porta e, para muitos produtores, o que deveria ser o início de um novo ciclo é uma dor de cabeça. Paulo Amorim, presidente da Associação Nacional dos Comerciantes e Exportadores de Vinhos e Bebidas Espirituosas (ANCEVE), fala em crise no sector e alerta para existência de produtores que se vêem na contingência de vender os seus vinhos ao 'desbarato' para escoar os stocks e ganhar espaço na adega para receber a nova colheita que vão vindimar. E garante mesmo que há quem esteja a vender "a 60 cêntimos o mesmo vinho que há um ano vendia a 1,80 euros", apontando como exemplo a região do Alentejo.

Não é tanto no consumo total de vinho que se sentem os efeitos da crise, diz, mas no perfil de consumo. "Houve um deslocamento grande em segmentos de preço. Já mais de metade dos consumidores em Portugal optam por vinhos extremamente baratos e isso tem sido péssimo para as marcas que estavam a implantar-se em patamares de mais qualidade e para os distribuidores", explicou. "Há cada vez menos pessoas dispostas a pagar um valor muito alto por uma garrafa de vinho e quem o faz é cada vez mais um nicho", refere.

Paulo Amorim alerta que as insígnias da grande distribuição hoje "já representam praticamente 80% das vendas" de vinho e as grandes superfícies "estão a privilegiar contactos directos com produtores, o que é mau para os distribuidores".

Dora Simões, presidente da Comissão Vitivinícola Alentejana, recusa ter stocks em excesso na região. "Temos uma vindima de existências, não mais. Os stocks de branco até estão muito baixos e seria desejável que tivéssemos um pouco mais de produção para satisfazer a procura", diz. Quanto aos preços, Dora Simões invoca os dados da Nielsen: "O Alentejo, em média, até tem preços superiores ao resto do país." E mesmo que haja uma ou outra marca a "escoar alguns stocks, não se encontram vinhos a 60 cêntimos", diz.

Com a vindima a meio, e a ser um "pouco mais lenta e mais prolongada" do que em anos anteriores, o Alentejo espera uma produção "de grande qualidade". Apesar de esperar uma produção 8% superior à do ano passado, a região estima que, nos brancos, o aumento seja apenas ligeiro. "O vinho vive muito por ciclos e está-se a notar uma procura crescente de vinhos mais leves e com acidez muito presente", salienta Dora Simões.

No Dão, a vindima está a arrancar mas Valdemar Freitas, presidente da comissão regional, diz que "estão reunidas as condições para uma excelente campanha". Sobre a crise referida por Paulo Amorim, Valdemar Freitas é peremptório: "Há menos poder de compra, consome-se menos!" O presidente da CVR do Dão admite que as adegas cooperativas, responsáveis por 56% da produção da região, possam sentir maior necessidade de escoar stocks, mas assegura que "não é uma situação crítica, podem é vender com margens de lucro mais estreitas".

No Algarve, as condições climatéricas originaram focos de míldio e oídio e as previsões apontam para uma quebra d aprodução da ordem dos 12%. Será, com a Península de Setúbal, as únicas regiões continentais com quebras de produção. Carlos Garcias reconhece que os efeitos da crise ao nível do turismo e da restauração se fazem sentir nas encomendas. "Se o decréscimo do consumo persistir, a situação poderá tornar-se complicada", diz.

No Minho, a vindima ainda agora vai começar. As adegas abrem hoje portas para a receber as uvas e a Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes tem na rua as operações de controlo, a exemplo das outras regiões, para garantir as genuinidade dos vinhos. As expectativas apontam para uma vindima de "qualidade média-alta". Ao nível dos preços, o presidente da comissão, Manuel Pinheiro, antecipa uma estabilização face ao ano passado, altura em que o quilograma de uva foi vendido, em média, entre os 45 e os 50 cêntimos, à excepção da casta Alvarinho, a uva branca mais cara de Portugal, paga acima de um euro o quilo.

 

Fonte: DN / Ilídia Pinto