Infelizmente não há dados muito concretos mas, pelo que ouvimos falar com vários intervenientes, um pouco por todo o país, o Míldio atacou em força este ano. A culpa foi das peculiares condições meteorológicas, que alternaram em Abril e Maio entre a chuva e o calor, um ambiente paradisíaco para o Míldio, que, como todos os fungos, é fã do calor e humidade.
Pelo que auscultámos, todas as regiões foram afectadas mas as menos habituadas a lidar com estes problemas, como as do interior e sul, foram as que mais sofreram. Mário Figueiredo, presidente da Cooperativa Agrícola de Pegões, dizia-nos que alguns agricultores que conhecia tinham a vindima feita: "chegaram atrasados; quando acordaram o mal estava feito". Luís Santos, técnico da AVIP, dizia que, ao contrário do que é normal, a doença começou pelos cachos e estendeu-se às folhas. Uma versão mais grave e mais tardia acabava por pintar de negro os cachos de um dia para o outro, terminando de uma vez por todas com qualquer aspiração de colheita.
A situação foi de tal maneira generalizada que chegou a haver ruptura nos stocks de fungicidas em algumas empresas de produtos químicos. Uma história contava que um viticultor alentejano teve que recorrer a embalagens de 250 gramas, as únicas existentes, para tratar a vinha de emergência. Consta que teve um homem o dia todo a abrir pacotes...
Os técnicos das empresas de agroquímicos são espectadores privilegiados desta situação. João Farraia Pessoa, gestor do sector de fungicidas na Sapec Agro, disse-nos que "as regiões mais afectadas foram o Douro, onde o Baixo Corgo terá tido uma quebra de produção estimada de 50%. Ribatejo e Península de Setúbal virão logo a seguir, com 40%, e depois o Alentejo, com 30%, especialmente nas zonas da Vidigueira e Redondo. Situação semelhante ocorreu nas Beiras, essencialmente na Beira Litoral, Bairrada e na região de Viseu. Quanto ao Minho, e ainda segundo este técnico, terá havido uma quebra mais pequena, de apenas 20%. João Farraia Pessoa acredita que é "provavelmente a região mais bem preparada para este tipo de fortes ataques já que é a que tradicionalmente é mais atacada por esta doença".
A experiência e o saber de viticultura foram mais uma vez cruciais: várias grandes empresas que sondámos reconheceram a gravidade dos ataques mas nenhuma delas teve prejuízos sérios. João Corrêa, enólogo-chefe da Companhia das Quintas, com vinhas em várias zonas do país confirmou-nos isto. E Filipa Tomás da Costa, da Bacalhôa Vinhos, também. Idem para Domingos Soares Franco, da José Maria da Fonseca. Outra confirmação veio de António Luís Cerdeira, produtor e técnico da CVR dos Vinhos Verdes. As equipas de campo actuaram a tempo e controlaram a doença. Assim escrito parece fácil mas não é: mesmo com os meios adequados há muitas decisões a tomar: quais os produtos certos, modos correctos de aplicação, timings exactos, muita atenção à meteorologia, correcto amanho da vinha, etc. O conhecimento e a experiência são aqui fundamentais. Quem esteve desatento, ou não tinha tempo, conhecimento ou meios, acabou por pagar uma pesada factura: enormes quebras de produção, que podem mesmo chegar à perda total.
Foi o que aconteceu a um agricultor do Dão: detectou o Míldio ainda a tempo mas não havia qualquer pulverizador disponível. E isso não espanta: um pulverizador é caro para um pequeno viticultor e muitos recorrem a empresas especializadas ou a amigos. Ora, trabalho de pulverização é coisa que não tem faltado nestes últimos tempos. Em vez dos habituais 3 ou 4 tratamentos, todos os intervenientes com quem falámos - de várias regiões do país - tinham já efectuado o dobro (ou quase) das acções preventivas ou curativas na vinha. Às vezes à pressa. Se nos Vinhos Verdes ou Bairrada se faziam 4 ou 5 acções, este ano fizeram 8 ou 9; e no Alentejo, das 2 ou 3 passou-se para 4 ou 5.
"A actual campanha ficará, seguramente, na memória dos viticultores como uma das mais difíceis do passado recente, no controlo do míldio da videira", garante João Vila Maior, da Bayer CropScience. E acrescenta outro factor: "o período da Páscoa e o 25 de Abril levou a que grande parte das vinhas não fosse tratada numa perspectiva preventiva. Foi o início do descalabro...". O factor técnico também teve influência: "num ano em que mesmo quem tratou bem esteve sujeito a dificuldades, quem cometeu erros teve prejuízos sérios". E houve gente que utilizou os fungicidas errados, ou em doses menores às homologadas ou ainda com pulverizações mal efectuadas...
Mesmo os que trabalharam bem têm que contabilizar os custos. O enólogo e produtor Nuno Cancela de Abreu, com explorações no Dão, disse-nos, em tom de brincadeira séria, que desta maneira avisava há dias o seu encarregado: "não me diga quanto é que eu já gastei em produtos químicos; não quero saber...". Mas a estratégia é mesmo não desanimar, porque tristezas não pagam dívidas.
Fonte: Revista de Vinhos / António Falcão
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